Certas certezas incertas…


A coisa mais desconcertante na história de Jonas é que a sua certeza mais certa era exatamente aquilo que ele mais queria que estivesse errado.

Jonas sabia que Deus era bom e que, ao cabo, agiria com misericórdia para com a cidade de Nínive. Mas, no fundo, desejava o contrário. O que Jonas faria, tivesse poder para tanto, seria exterminar aquela gente perversa e pecadora. Eis aí o paradoxo: Jonas tinha uma ideia sobre o que “deus” devia fazer, mas sabia quem era Deus e o que, de fato, Ele faria. Por isso, fugiu Jonas, na tresloucada expectativa de que Deus desistiria de amar os pecadores ninivitas. Não funcionou, por certo.

Jonas é um retrato de todos nós. No fundo, queremos controlar Deus. Imaginamos saber exatamente o que Ele pensa, e como deve agir. Nunca conseguiremos! A verdade incontornável é que Deus é Deus e faz como bem quer. E o que Deus quer é o bem, sem olhar para quem! Habita um equívoco no coração humano: achar que a criatura limitada e caída, tem algum controle sobre o Criador. Sutilmente, achamos que é possível colocá-lo em uma “caixinha” imutável, plena de certezas, completamente compreendida. Se assim fosse, não seria Deus, mero ídolo seria. Há uma certeza, contudo, que podemos ter sobre Deus, o seu caráter. Este sim, imutável: Ele é bom! E por que Ele é bom, é que Ele perdoa o povo de Nínive, exatamente como Jonas não era capaz de conceber.

Esta dificuldade de perdoar que carregamos no peito, feito Jonas, revela uma estranha tendência humana de se alegrar com o castigo do outro. Chamamos a isto, de modo rápido e irrefletido, de justiça. Ainda bem que Deus não é assim. Deus não se alegra com o sofrimento, mesmo dos que são maus. Não! Deus se alegra é com o arrependimento: faz festa em sua casa, põe anel no dedo, chinelo no pé e túnica sobre corpo. Deus abraça, beija! E porque Ele é bom é que Ele pondera, e fala, e ouve, e indaga, aos “jonas” que habitam o coração humano: “ – É razoável, Jonas? É razoável tamanha ira?”

O fim da história de Jonas não revela a sua resposta a tais perguntas. Ficamos sem saber se ele teria sido capaz de aceitar a Graça, ao final? E nós, seremos algum dia, capazes de compreendê-la?

Séculos depois, o Deus Encarnado contou história semelhante, na parábola do pródigo: o que teria, enfim, decidido o filho mais velho, diante do convite paterno para se juntar à festa do seu irmão que esteve perdido e retornou, que esteve morto, mas reviveu? Jesus não quis nos dizer. Preferiu deixar em aberto. Quiçá porque, sendo Deus, já tivera oportunidade de ver semelhante desfecho na experiência de seu profeta fujão.

Milênios se passaram, mas a pergunta ecoa e chega até nós: “E então, vai subir para a festa, ou ficar aí acalentando a ilusão de que sua justiça é melhor que a do Pai?”

Por Cayo César Santos – Presbítero da Igreja Presbiteriana do Planalto, membro do Centro Cristão de Estudos e colaborador na área de mentoria do Projeto Vocatio, em Brasília/DF. Autor do livro “Século I: O Resgate” Ed. Ultimato.

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