Da escuridão para a luz

O Evangelho de João narra a história de Nicodemos. Um doutor da lei, líder em Jerusalém. Nicodemos, com medo de ser identificado como seguidor do profeta Nazareno, escolhe o escuro da noite para procurá-lo. Mas no fim, quando da crucificação do Mestre, lá estava Nicodemos, reivindicando seu corpo moído pela cruz a Pilatos e aos soldados romanos, à luz do dia, se identificando como amigo e seguidor do crucificado!

Jesus de Nazaré é Deus que nos recebe, mesmo no escuro. Mesmo em nossa escuridão. Nas sombras do nosso coração. Nossa escuridão pode ser a vergonha enrustida que carregamos de sermos associados ao seu nome num mundo tão racional, tão científico, tecnológico e moderno. Como posso ser identificado como alguém que ainda se apega a tamanhas ilusões e misticismos, histórias para crianças, contos de fadas impossíveis de comprovação pelo método irrefutável da ciência? Nossa escuridão pode ser o medo sufocado, e sufocante, de perder status e respeito de nossos pares. Como estar ligado à tolice romântica do amor e do perdão em um mundo onde somente o vencedor tem valor? Nossa escuridão pode ser a vontade de fazer bonito, alcançar as melhores posições, ser temido ou aclamado pelas conquistas. Como estar ao lado dos pequeninos e desprezados, viver uma vida simples e despojada, com coração humilde e misericordioso? Ainda assim, Jesus Cristo é Deus que nos acolhe, mesmo na noite escura da nossa timidez. Sempre houve, continua havendo e sempre haverá, uma coerência profunda na disposição do coração do nosso Senhor: jamais despreza aos que o buscam. Mesmo de noite, mesmo no escuro, mesmo com dúvida, mesmo com medo, mesmo às escondidas, mesmo trôpegos e na surdina, mesmo que imperfeitos, a todos Ele recebe. Mesmo àqueles que, se entendendo mestres, pouco conseguem compreender acerca do amor de Deus. Desde que não sejam arrogantes, Ele os ouvirá. Jesus, o Redentor, é Deus que nos ensina sobre o que é mais importante na vida. Propõe-nos, na verdade, um novo viver. Um novo nascimento. Nascimento que se dá no impossível, no inimaginável, no inconcebível. Como poderemos voltar ao ventre materno e nascer de novo? Ele nos dá o seu Espírito! Jesus, Emanuel, é o amigo que se alegra quando voltamos mais tarde na história da nossa vida e revelamos o quanto aprendemos na caminhada. Revelamos, na verdade, nossa própria face, de pé, diante da sua cruz e do seu sacrifício, diante dos poderosos e dos zombadores, e reivindicamos para nós, as marcas e pisaduras de seu corpo quebrado, trazemos as honras e os perfumes para adornar o seu santo e doce nome, e nos apresentamos como seus amigos. Jesus, Deus que nos abraça, lança luz sobre a nossa escuridão, lança fora todo medo, toda vergonha e, passo a passo, pacientemente, nos livra da covardia.

 

Por Cayo César Santos – Presbítero da Igreja Presbiteriana do Planalto, membro do Centro Cristão de Estudos e colaborador na área de mentoria do Projeto Vocatio, em Brasília/DF. Autor dos livros “Século I: O Resgate”; “Século I: A Reconstrução”, obra que recebeu o Prêmio Areté/2019 na categoria ficção/romance; e “Século I: A Revolução”, Editora Ultimato.

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